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segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

                  



                 A Triste  Crônica de Nelly Novaes Coelho
                     


                                                           Cyro de Mattos                                         
                 


                  Nelly Novaes Coelho é uma dessas criaturas belíssimas  que encontrei na vida. Intelectual de expressão enorme, erudita, sensível, solidária e ética. Tive o grande prazer de conhecê-la quando fui receber de suas mãos O  Grande Prêmio  da Associação Paulista dos Críticos de Artes, no Memorial da América Latina, em 1992, concedido ao nosso livro de poesia infantil . Ela foi a relatora da comissão julgadora,  que contou ainda com a participação de Tatiana Belinky e Pascoal Mota. Quanta alegria conhecer aquela mulher baixinha, de sorriso afável,   olhos no óculos de lente grande  que viam e compreendiam  o que  estava no mundo para ser alcançado.
               Dali para frente  mantive correspondência regular  com umas das intelectuais mais lúcida em nossas letras, portadora de um discurso simples, mas rico de análise, que impressionava bastante.   Que bênção! O tom de suas cartas era sempre atencioso, deixava a minha alma pingando ternuras.   Tive uma boa surpresa quando recebi comentário como autor infantojuvenil no seu  esplêndido Dicionário crítico de  literatura infantil e juvenil brasileiro. Outra belo susto que eu tive  foi  quando vi minha ficção de contista ser objeto de estudo no  monumental volume  Escritores brasileiros do século xx. Nessa obra, de novo ela demonstra  ser uma ensaísta de fôlego vasto,  que tem conhecimento notável dos meandros da escrita,   da vida e do contexto dos escritores estudados na obra.   Ao escrever esse livro, Nelly Novaes Coelho ainda estava em plena atividade intelectual,  tinha 91 anos,  idade em que muitos  já penduraram suas ferramentas de trabalho.  
          Vale a pena lembrar que com 752 páginas, 1401 verbetes, o Dicionário crítico de escritoras brasileiras, de Nelly Novaes Coelho, registra de modo condigno  “ a voz de   mulheres que vêm dando seu testemunho de vida e ideais, por meio da Palavra”. Dado que a literatura  é forma ampla de conhecimento dos humanos no mundo, a obra que foi organizada pela escritora renomada, Doutora em Letras da USP,  reveste-se de pontos elevados na valorização do corpo literário brasileiro.
       Ao registrar  inúmeras vozes femininas de todos os estados brasileiros, em sua contribuição enciclopédica, Nelly Novaes Coelho, como os iluministas de ontem,  desincumbe-se da jornada extensa  com erudição, consciência crítica e lucidez de pesquisadora dotada de santa paciência. É muito pouco o que estou informando sobre a bagagem,   atuação e  produção de uma intelectual incansável como a Nelly. Por seus feitos literários incríveis, ela  merecia as melhores homenagens  em vida. Quando indiquei   com os escritores Caio Porfírio Carneiro e Nicodemos Sena o seu nome  para ser distinguido com  O Trofeu Juca Pato da União Brasileira de Escritores (SP),  foi  vítima de um processo eleitoral duvidoso,  e  seu nome  não foi sufragado. Mas ela era maior do que certas atitudes deploráveis e honrarias dessa espécie.

 Soberba como ensaísta e,  como  professora universitária, contribuiu  para a formação de inúmeras gerações no campo das Letras. Sua família ignorou a grandeza dessa mulher incomum.   Ao ficar doente,   foi blindada pela família, que não permitiu a  visita dos amigos, dos que lhe tinham afeto, e de seus admiradores.   Meu Deus, quanto egoísmo, para não dizer escuridão,    pobre de  nós seres humanos, metidos a donos de tudo.  Agora essa notícia triste, que  tomo conhecimento através do escritor  Ronaldo Cagiano,   Depois de um mês  de seu falecimento, a  imprensa divulga  o fato  em notas acanhadas. A doce, ética e intelectual maiúscula Nely não merecia tanta maldade. 

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