Amado Menino de
Belém
Cyro de Mattos
Contam que nasceu numa manjedoura, em
Belém, o berço era de palha. Foi anunciado por uma estrela, no céu toda acesa
de Deus. Os bichos cantaram: Jesus nasceu! Jesus nasceu! Os pastores tocavam
uma música serena nas suas doces flautas. São José, o pai, o que tinha mãos
habilidosas no manejo de enxó, plaina e formão, soube que de agora em diante ia
talhar a mais pura fé do seu constante coração. A Virgem Maria, mãe do menino,
dizia baixinho: Pobrezinho quando for um homem, de tanto nos amar, vai morrer
na cruz.
Os
três reis magos foram chegando, vieram de longe, muito longe, atravessaram
montanhas e desertos. Traziam, como presente para o menino, mirra, incenso e
ouro. Ajoelharam-se, sabiam que não eram dignos de tocar naquela palha. Bastava
agora que fizessem o bem ao próximo e seriam alçados aos céus no final de suas
vidas. Abelhas com os seus zumbidos de
ouro vieram colocar afeto e mel no coração de cada um dos reis.
Contam
mais que foi um menino que brincava como qualquer menino. Gostava de ficar
sozinho, mirando a linha do horizonte. Quando ficou rapaz, não teve dúvida, havia
sido o escolhido pelo Pai entre os humanos para ultrapassar aquela linha no
horizonte. Para conseguir a façanha
teria que fazer uma mágica em que disseminasse uma rosa na manjedoura dos ares.
Juntar todas as mãos numa só mesa onde todos seriam irmãos.
Teve
que trazer as sementes dadas pelo Pai para plantar cirandas nas areias do
deserto. E assim, em cada ciranda que fazia entre os sofredores do ver e do
viver, os sentimentos daquele homem humilde, com ares de profeta, correram nas águas doces do rio,
seguiram no vento manso, que soprou a flor sozinha na plantinha do brejo. E
foram levados pela borboleta até o lugar onde o amor sempre permanece, fazendo
morada nas asas da ternura.
Acharam
que sua mensagem batia de frente com o conforto dos donos do poder quando saía
por aí de mãos dadas com os excluídos e curava os enfermos. Espalhava a esperança na pobreza dessa terra. Convencia
os homens de que viver vale a pena desde que a vida seja exercida numa comunhão
em que não haja desigualdade, injustiça, opressão e hipocrisia. Só dependia de
nós que a vida fosse como uma dança, sem agressão, os bichos sem matança, a
mata livre da queimada, as nuvens despejando a chuva para fertilizar a terra,
desprovida do veneno letal da poluição.
Os donos do poder no sistema organizado não
perdoaram a afronta. Traçaram o mais pérfido caminho para ele ultrapassar a
linha do horizonte, que tanto contemplara quando era criança. Fizeram que carregasse uma cruz pesada.
Puseram uma coroa de espinho na cabeça, cuspiram nele, chicotearam. Morra o
rebelado, o falso profeta, o demolidor da ordem, o mentiroso fazedor de
milagre, alardearam. Os que estavam com
raiva nos olhos, perjuro no coração, fúria canina nas veias, investiam,
urravam, não se cansavam de pedir que fosse condenado o subversivo do
sistema. Ficaram calados quando foi
decretada a crucificação. Não aceitaram que no seu lugar ficasse o ladrão, que
para ali fora apenado com a crucificação pelos crimes cometidos.
Mas o
que se viu, depois de perversa infâmia vinda de uma perseguição sem igual, é
que até hoje tocam os sinos do bem na cidade e na campina, só para nos dizer
que do menino nascido na manjedoura se fez um homem para ofertar a todos o amor,
apesar de receber em troca seguidas pedradas. No final crucificado para que se
cumprisse a profecia, o bendito salvador da humanidade veio para nos dizer que
era o filho do Pai Eterno, perdoava a todos que não sabiam que a mais difícil
prova era a da inocência.
Blem, blem, blem, confirmam até hoje o
acontecido os sinos de Belém, dizendo que o Menino Deus veio ao mundo dos
humanos por nos querer tanto bem.